Nunca soube as palavras, e tu sabe-lo desde sempre. E é por isso que todos os dias colo post-its coloridos no peito para não me esquecer de gostar de ti. Também todos os dias escolho aquele vestido de flores nuas para levar à rua, mas nunca o ponho com medo de o sujar. E ali fica ele, pendurado à janela, com a vida que não lhe dou, ao fresco do ar que sobe ao céu alto. Com ele ficam as violetas que apanhamos naquele dia que sempre esqueço de colocar na jarra e os brincos de madeira que compramos na barraca junto ao mar, onde as ondas lavaram os nossos pés juntos. Os chinelos de tira continuam na gaveta de baixo, à espera que faça sol. Já não me lembro onde deixei o lenço, aquele dos versos estampados que tu me ofereceste quando passamos o dia de mãos dadas, a conhecer os dedos um do outro e a saber de cor o cheiro de cada fio do nosso cabelo. Ainda sei de onde vieram as moedas que lançamos no poço dos desejos, onde eu e tu nos prometemos um ao outro, mas já não me lembro se desejei nunca largarmos as mãos. E isso deixa-me triste. Deixa-me triste porque eu gostava da tua mão a segurar a minha.
Já não recordo do anel de fita verde, aquele que fizeste para mim quando passamos o dia num campo de malmequeres. Sei que alguém estampou os malmequeres na parede, mas não decorei o número da porta. Na minha cabeceira ainda está o poema que fui quando me pediste, tão belo, que te amasse para sempre. A tua voz evaporou-se do quarto, mas o poema está lá, em folha de papel gasto, como um relógio parado, a marcar a data em que tudo foi diferente. Agora sim, agora sinto que o céu é verde como me contaste e que é fácil tocar as estrelas como pianos amarelos. Ainda ontem fiz cócegas numa, mas quando ela foi dormir eu fiquei louca outra vez. Só há uns dias é que fui buscar o perfume do teu peito que tinha guardado na casa velha. Parti o frasco, amor, desculpa! Sou tão descuidada! Agora o teu perfume espalhou-se todo pelas paredes brancas.
O post-it voou. Esqueci-me de fechar a janela durante a noite e de me lembrar o quanto gosto de ti. Eu disse que não sabia as palavras...
Adeus, um dia volto, ou voltas tu se ainda recordares os passos para casa...
11 comentários:
Adiamos tanta coisa na vida...uma palavra, um beijo, até ser tarde demais...Esperemos que a memória perdure para o regresso a casa.
Adiámos e deixamos esquecer, esse é que é o mal... Lá se vai a memória dos tempos quentes, e das saídas à noite, e do vento a refrescar a cara... Quero voltar àquela casa, mas não lembro a morada...
beijos sentidos, Mac
Vim aqui ter não sei como.
E fiquei presa ao ecrã, à magia das tuas palavras que me tecem e me envolvem.
Aos sentimentos.
Fiquei aqui presa a ler e a reler. Adorei.
ótima coleção de fragmentos de um discurso amoroso!
Poucas pessoas poderiam escrever algo tão belo e iluminante!
Dark kiss.
Lord, poucas pessoas poderiam elogiar tanto com tão poucas palavras...
beijinhos
grata
Obrigada André,
as palavras dão vida, e é vida que eu quero!
beijos, volta :)
Beta,
fico agraciada por saber que gostaste e que te prendi. :)
Os sentimentos prendem, sim, mas só se estiveres disposta a que eles te prendam, por isso obrigada por vires de coração aberto...
Obrigada,
beijinhos e volta,
gostei de te ter por cá...
muito bonito, sentido.. e quantas vezes colarmos post-its coloridos no peito é a única forma de nos lembrarmos de algo..
passei aqui por acaso, mas vou passar a vir propositadamente. bom texto.
***
Ainda bem, Charlott... é bom saber que, após compassos de espera, ainda há quem goste de me ler... :)
Obrigada...
beijinhos**
Ainda bem, Charlotte... é bom saber que, após compassos de espera, ainda há quem goste de me ler... :)
Obrigada...
beijinhos**
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