no reino dos céus

Os pássaros voam tanto mais alto quanto maior for o céu a que se dispõem. Os meus sonhos também voam, e voam alto, por onde devem voar os sonhos e os deuses. Eu confundo-os, aos deuses e aos sonhos. Os meus sonhos viajam entre as vestes vaporosas de nuvens cobrindo os corpos prateados de Afrodites ocas e migram entre as madeixas douradas de Teseus ruivos de sol, melodiando entre os acordes de Orfeus no Mundo dos Mortos e sorrindo às ninfas que cantam as sinas ao vento do Tejo. Os meus sonhos também são vida, e eu respiro-os com a força de um trago angustiante de borboletas amarelas e de folhas caídas que não tocam o vento. Os meus sonhos também são festas azuis onde os sorrisos esgotam e as lágrimas brotam de sementes pálidas e rugosas, os ventres descobertos espalham magia e sedução a cada espasmo e os olhos são verdes... sempre verdes... verdes água e esfinges de pedra roxa no lugar das mãos duras. E a minha voz espalha-se num sussurro lento pelo ar condensado da laringe, chega aos atilhos da memória fluorescente dos lábios encarnados e aí repousa, como o ópio num beijo envenenado de luxúria por Édipos e complexos que se revoltam nas minhas próprias páginas e idades.

Sei que sem sentido e sem marés os ventos não uivam, mas espalham-se mais longe e mais alto do que por labirintos infestados de segredos e trotes combinados em luz desafogada. Que Ares os guie e os conquiste em batalhas de fogo e reinos de deuses traiçoeiros se tomem de saque, que o mensageiro Hermes os avise e proteja as minhas palavras e que Dionísio as multiplique como moscas de peste.

Que os sonhos se aplaudam e se glorifiquem em medalhões de seda.
Que o meu sangue seja servido em terrinas de prata.